quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Se os tubarões fossem homens...

Bertold Brecht

Se os tubarões fossem homens, eles fariam construir resistentes caixas do mar,
para os peixes pequenos... Naturalmente também haveria escolas nas grandes
caixas, nessas aulas os peixinhos aprenderiam como nadar para a guela dos
tubarões... Aula principal seria naturalmente a formação moral dos peixinhos.
Eles seriam ensinados de que o ato mais grandioso e mais belo é o sacrifício
alegre de um peixinho, e que todos eles deveriam acreditar nos tubarões,
sobretudo quando esses dizem que velam pelo belo futuro dos peixinhos. Se
encucaria nos peixinhos que esse futuro só estaria garantido se aprendessem a
obediência... Se os tubarões fossem homens, eles naturalmente fariam guerra
entre si a fim de conquistar caixas de peixes e peixinhos estrangeiros. As
guerras seriam conduzidas pelos seus próprios peixinhos. Eles ensinariam os
peixinhos que, entre os peixinhos e outros tubarões existem gigantescas
diferenças... Cada peixinho que na guerra matasse alguns peixinhos inimigos da
outra língua silenciosos, seria condecorado com uma pequena ordem das algas e
receberia o título de herói...
Também haveria uma religião ali. Se os tubarões fossem homens, eles ensinariam
essa religião. E só na barriga dos tubarões é que começaria verdadeiramente a
vida. Ademais, se os tubarões fossem homens, também acabaria a igualdade que
hoje existe entre os peixinhos, alguns deles obteriam cargos e seriam postos
acima dos outros. Os que fossem um pouquinho maiores poderiam inclusive comer
os menores, isso só seria agradável aos tubarões, pois eles mesmos obteriam
assim mais constantemente maiores bocados para devorar. E os peixinhos maiores
que deteriam os cargos valeriam pela ordem entre os peixinhos para que estes
chegassem a ser professores, oficiais, engenheiros da construção de caixas e
assim por diante. Curto e grosso, só então haveria civilização no mar, se os
tubarões fossem homens.

(*) BRECHT, Bertold (1926-1956). Histórias do Sr. Keuner. São Paulo: Editora 34,
2006.

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