O texto mais lúcido que li sobre o episódio envolvendo os jogadores do
Santos numa visita ao Lar Espírita Mensageiros da Luz, que cuida de
crianças com deficiência cerebral para entregar ovos de Páscoa. Uma
parte dos atletas, entre eles, Robinho, Neymar, Ganso e Fabio Costa,
se recusou a entrar na entidade e preferiu ficar dentro do ônibus do
clube, sob a alegação que são evangélicos.
" Os meninos da Vila pisaram na bola. Mas prefiro sair em sua defesa.
Eles não erraram sozinhos. Fizeram a cabeça deles. O mundo religioso é
mestre em fazer a cabeça dos outros. Por isso cada vez mais me
convenço que o Cristianismo implica a superação da religião, e cada
vez mais me dedico a pensar nas categorias da espiritualidade, em
detrimento das categorias da religião.
A religião está baseada nos ritos, dogmas e credos, tabus e códigos
morais de cada tradição de fé. A espiritualidade está fundamentada nos
conteúdos universais de todas e cada uma das tradições de fé.
Quando você começa a discutir quem vai para céu e quem vai para o
inferno, ou se Deus é a favor ou contra à prática do homossexualismo,
ou mesmo se você tem que subir uma escada de joelhos ou dar o dízimo
na igreja para alcançar o favor de Deus, você está discutindo
religião. Quando você começa a discutir se o correto é a reencarnação
ou a ressurreição, a teoria de Darwin ou a narrativa do Gênesis, e se
o livro certo é a Bíblia ou o Corão, você está discutindo religião.
Quando você fica perguntando se a instituição social é espírita
kardecista, evangélica, ou católica, você está discutindo religião.
O problema é que toda vez que você discute religião você afasta as
pessoas umas das outras, promove o sectarismo e a intolerância. A
religião coloca de um lado os adoradores de Allá, de outro os
adoradores de Yahweh, e de outro os adoradores de Jesus. Isso sem
falar nos adoradores de Shiva, de Krishna e devotos do Buda, e por aí
vai. E cada grupo de adoradores deseja a extinção dos outros, ou pela
conversão à sua religião, o que faz com que os outros deixam de
existir enquanto outros e se tornem iguais a nós, ou pelo extermínio
através do assassinato em nome de Deus, ou melhor, em nome de um deus,
com d minúsculo, isto é, um ídolo que pretende se passar por Deus.
Mas quando você concentra sua atenção e ação, sua práxis, em valores
como reconciliação, perdão, misericórdia, compaixão, solidariedade,
amor e caridade, você está no horizonte da espiritualidade, comum a
todas as tradições religiosas. E quando você está com o coração cheio
de espiritualidade, e não de religião, você promove a justiça e a paz.
Os valores espirituais agregam pessoas, aproxima os diferentes, faz
com que os discordantes no mundo das crenças se deem as mãos no mundo
da busca de superação do sofrimento humano, que a todos nós humilha e
iguala, independentemente de raça, gênero, e inclusive religião.
Em síntese, quando você vive no mundo da religião, você fica no
ônibus. Quando você vive no mundo da espiritualidade que a sua
religião ensina – ou pelo menos deveria ensinar, você desce do ônibus
e dá um ovo de páscoa para uma criança que sofre a tragédia e miséria
de uma paralisia mental. "
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